Minha avó morreu há menos de um mês e me perguntaram se eu escreveria sobre ela. Ainda presa nesse tecido que enevoa os sentidos chamado luto decido aceitar a missão.
Ela estava com quase 96 anos e nunca deve ter ouvido falar de empoderamento feminino mas entendia disso como ninguém.
Perdeu uma perna aos dois anos de idade (picada de cobra no interior de Goiás), a mãe faleceu logo depois e ela teve uma madrasta que não era muito legal. Nunca a vi reclamando de nada, e era quase impossível se queixar de alguma coisa na frente dela. Estava sempre arrumada mas sem excessos. Trabalhou até se aposentar e me ensinou a não depender de ninguém (pena que as filhas não seguiram seu conselho). Dizia sempre que era mais importante ser boa que bonita (e ela era linda). Exercia sua autoridade e impunha respeito sem levantar a voz, sabia se posicionar e ser forte sem intimidar os outros.
Não falava mal de ninguém, não tinha redes sociais e recebia as pessoas de braços abertos e com muita comida. Foi uma mulher de bastidores, altiva e humilde. Perdeu um filho com 12 anos (alguém imagina sofrimento maior?) e soube manter a fé e a dignidade. Até os 92 anos tomava apenas cálcio, nunca fez dieta e sempre comeu de tudo. Não se preocupava com botox, preenchimento, plástica, roupas caras, e ainda assim era uma pessoa completa, inteira, que ganhava mais que o marido mas sabia deixá-lo confortável com isso, cuidava bem da casa e dos filhos. Ela me ensinou a rezar, a costurar (não deu certo), a fazer pamonha e amassar biscoitos de queijo e roscas. Deixou três filhos, seis netos, sete bisnetos e tirando todos os defeitos e aquela mania de ser controladora até na hora da morte, ela vai ser sempre meu exemplo de resiliência e coragem. Talvez sejam esses valores que nós mulheres precisamos resgatar nessa busca pelo empoderamento. Obrigada dona Izabel.