Remendo:
Tentativa de não perder, agarrar o passado, esforço vão de juntar o tempo, uma normalidade falsificada e fingida.
Miguel fuma um cigarro escutando a velha música que toca no novo rádio, ele observa o relógio que corre sem parar, o maldito não perde o fôlego, o relógio é uma das criaturas mais atentas já criadas. Miguel caminha até a mesa que está no canto da pequena sala e senta confortavelmente na sua insônia preferida, pelo chão muitas histórias desgastadas e rasgadas, retalhos de felicidades passageiras.
Histórias rasgadas, umas foram rasgadas pelo desgaste natural, outras pela intensa violência característica de algumas relações e as histórias que sobraram foram devoradas silenciosamente pelas traças famintas, no fim, o tempo tem fome de tudo.
Chet Baker despeja no ar “My Funny Valentine” (a única coisa inteira naquele apartamento).
A única certeza que Miguel tem às 3h38 da manhã é que alguém sem uma história de amor e alguém que beira a invisibilidade. Ele sente isso na pele, nas mensagens que não chegam mais e nos olhares que fugiram dos olhos.
Miguel já não lembra como esses tecidos frágeis chamados histórias de amor foram rasgados, a memória não é a mesma e a culpa foi de quem? Quem é o dono da culpa, ele sempre ouviu que a culpa era sua e a culpa é uma herança maldita.
Pensou nos remendos, lembrou-se da infância e das suas calças jeans com várias cores diferentes nos joelhos, os joelhos rasgados eram comuns na sua infância, lembrou-se de sua mãe costurando pacientemente com um sorriso de sol pendurado no rosto marcante de 50 e poucos anos, as calças remendadas tornaram-se as favoritas de Miguel, talvez fosse um sinal, tudo em Miguel já foi ferida.
É uma pena que as histórias não possam ser remendadas, ficam as memórias pelo chão e a música pelo o ar.
Miguel se levanta e para em frente à janela, fica um tempo olhando a silenciosa cidade e as poucas janelas acesas, janelas que abrigam homens e mulheres tentando consertar aquilo que já não pode ser consertado.
Miguel sorri.
“A única certeza que Miguel tem às 3h38 da manhã é que alguém sem uma história de amor e alguém que beira a invisibilidade. Ele sente isso na pele, nas mensagens que não chegam mais e nos olhares que fugiram dos olhos.”
Essas madrugadas que nos fazem refletir e ter certezas tão profundas.
❤
Mais um excelente texto, belo escritor.
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Que lindo!
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Literalmente sem palavras.
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My funny valentine, Chet Baker. Enquanto lia senti o clima do cenário através da canção. Perfeito.
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❤
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muito bom, amigo!
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“A única certeza que Miguel tem às 3h38 da manhã é que alguém sem uma história de amor é alguém que beira a invisibilidade.”
Certeza de todas as horas, moço.
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Essas certezas que temos durante a madrugada nos faz ver, que ainda que haja muitas histórias onde podemos errar novamente, devemos recomeçar todos os dias. Não se pode desistir do amor!❤
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Que texto! Os remendos são marcas eternas de novos recomeços… ❤
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Zack, meu ídolo… bendito o dia que te “encontrei”… não sei como vivia sem ler os teus textos… ❤
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Perfeito!
Parabéns pelo belíssimo trabalho!!!
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